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O graff também tem destas cenas... Andava eu a fotografar pelo Ginjal quando me cruzei com o francês OPAF que se preparava para pintar uma nova peça. Feitas as apresentações, combinámos ir trocando impressões pelo Instagram.
No dia seguinte, quando lá fui fotografar o trabalho concluído, cruzei-me novamente com o autor, que ia a correr para ver a final do Campeonato Mundial de Futebol.
Os azuis não venceram, mas nem tudo se perdeu. Eu ganhei um novo entrevistado e OPAF teve oportunidade de pintar na última jam do Magus.
Fiquem com a entrevista deste fã de ficção científica e de séries de animação. E que venham mais encontros destes!
Qual é o significado do teu tag?
Quando comecei no graffiti não me sentia confortável com letras (eu sei que é a gota d'água). Então, cada vez que eu começava uma nova peça eu trocava de blase porque as letras anteriores não combinavam comigo. Até que um dia conheci um artista alemão nómada que morava na fábrica abandonada onde comecei. Ele aconselhou-me a escolher as minhas iniciais e continuar com essas letras. Como não gostei das letras das minhas iniciais, escolhi as iniciais do meu pai, que são mais gráficas para mim. Aqui está o significado do meu blase. Desde então, tenho usado o alfabeto alienígena Futurama para escrever o meu blase. Isso permite que eu me diferencie e também torna mais difícil para a polícia fazer o seu trabalho.
Tens formação em arte?
Eu não tenho propriamente formação artística. Quando eu era criança desenhava muitas bandas desenhadas com o meu amigo Théo Schulthess (que se tornou ilustrador profissional) e distribuíamos no recreio. Além disso, estudei design gráfico durante os meus estudos em comunicação. Eu uso-o para construir os meus posters, mas é só isso.
Quando começou o teu interesse pelo graffiti e quais foram as tuas influências na altura?
Comecei no graffiti quando tinha 15 anos (tenho 31 agora). Naquela época eu era influenciado pelas bandas desenhadas e pela cultura punk. Nas minhas várias viagens, lhava para os graffitis e para os tags com mensagens anti-sistema com muita atenção.
Um dia, um amigo meu voltou do seu fim de semana com latas de spray e propôs irmos pintar juntos. Fomos pintar as casas de banho públicas da minha vila de infância. Depois de 20 minutos trancados numa casa de banho a pintar todas as parvoíces que poderíamos pensar, saímos completamente gaseados (aerossol não é bom para o cérebro). Então, saí da casa de banho com uma moca e com um novo vício: graffiti.
Como era a cena do graffiti quando começaste?
Quando comecei no graffiti por volta de 2006, o mundo (não apenas o graffiti) estava na revolução das redes sociais. Quando antes, para ver graffiti, era preciso viajar ou ler revistas especializadas, a criação do Facebook (2004) permitiu a todos os writers partilhar a sua arte. Assim, ficou mais fácil ver o graffiti e compartilhá-lo. Naquela época, falava-se muito do trabalho na rua e da sua limpeza. Comecei com muitos comentários sobre a limpeza das minhas linhas e é isso que tento continuar.
Já pintaste em quantos países?
Segundo a ONU, existem 193 países no mundo. Até que eu tenha pintado em todos eles, para mim nunca será suficiente.
Nesta passagem pelo nosso país, como descreves o panorama atual do graffiti e da street art em Portugal? Que diferenças encontras em relação à França?
Não moro em Portugal há tempo suficiente para responder a esta pergunta adequadamente. No entanto, como franco-português, tenho visto que em Portugal houve muitas indústrias (e também edifícios) que fecharam portas, infelizmente. Isso deixa muitos espaços de criação livres para os writers. Para mim, esta é uma das razões porque o graffiti em Portugal está tão vivo. O graffiti é uma arte popular e ter este tipo de espaço é mais do que necessário para expressar todas as emoções.
Na França temos um pouco menos de espaço livre porque temos menos indústrias fechadas (embora isso esteja a mudar). Fora isso, há muito pouca diferença entre a cena do graffiti francês e a portuguesa. O movimento Graffiti é um movimento de expressão mundial. E as regras são as mesmas em todos os lugares. A cena portuguesa distingue-se, provavelmente, pela Saudade.
Quais são os teus spots / cidades favoritos para pintar?
Eu gosto muito de lugares abandonados para pintar. Por vários motivos: em primeiro lugar, os polícias raramente vêm incomodar quando pintas nesses lugares e, em segundo lugar, porque posso dedicar tempo à pintura. É importante para mim dedicar o meu tempo à pintura. O mundo em que vivemos passa muito rápido e a pintura é para mim um momento onde o tempo pára e no qual posso encontrar-me. Por momentos, sou só eu e a parede. Tudo o resto é irrelevante.
Como é o teu processo criativo e de onde vais buscar as inspirações para as tuas peças?
Eu tiro a minha inspiração de tudo ao meu redor, mas mais em particular da ficção científica, que é outra das minhas grandes paixões. Gosto de partir de obras de ficção científica mais ou menos conhecidas do grande público, para reduzi-las à sua essência e utilizá-las para evidenciar factos da sociedade que me tocam. Espero, de forma modesta, contribuir para os debates sociais com o meu trabalho.
Pintas com sketch ou freestyle?
Uma mistura de ambos. Quando tenho a ideia, faço muitos rascunhos com muito pouco trabalho para colocar os principais elementos e estruturas. Tirando isso, todos os detalhes são trabalhados diretamente na parede.
Graffiti, stencil, paste-up... qual é o teu estilo preferido?
Todos eles! Eu uso todas essas técnicas. Comecei a minha prática com graffiti e tagging. Desde há 4 ou 5 anos, uso cada vez mais colagem. Isso permite-me invadir uma cidade em pouco tempo e por muito pouco dinheiro. Quanto aos stencils, utilizo-os principalmente para os trabalhos que exponho.
Também pintas em tela? Quantas exposições já fizeste?
Sim, também pinto em tela. Ou melhor, em molduras feitas com pedaços de paletes que encontro na rua. Prefiro este material quando pinto obras para as minhas exposições. Isso permite-me trazer um pedaço da rua para um lugar mais convencional. Neste momento, tenho uma individual e várias coletivas.
O que toca na tua playlist quando produzes a tua arte?
Depende muito do meu estado de espírito e das pessoas com quem pinto. Pode ser qualquer coisa, desde T'Choupi (Big up para TLS / GBR / WTC) até música clássica.
Geralmente, o que ouço é rap. Gosto muito do coletivo High Focus em Londres e do coletivo L'animalerie em Lyon. Eles representam, provavelmente, 80% do que ouço quando pinto.
Qual é o teu top 3 de writers / artistas portugueses?
Aprecio o trabalho de Bordalo II, Odeith, Pampa, Mais Menos, Pantonio e Vhils, para citar apenas alguns. Eu não seria capaz de fazer um top 3.
E de writers / artistas estrangeiros?
Eu sigo muitos artistas de diferentes países. Mas, para ser sincero, os writers de que mais gosto são meus amigos.
Com que writer /artista gostarias de fazer uma peça conjunta?
Não tenho um nome em particular em mente. Eu vou principalmente pelo sentimento.
Já organizaste algumas jams em França. Tens planos para organizar uma aqui?
Sim, organizei várias jams grandes e pequenas na França. Gosto dessas atmosferas onde nos encontramos para compartilhar a nossa paixão e pintar. O que eu mais gosto é o que chamo de "graffiti de churrasco". Isso quer dizer que pintar uma parede é apenas uma desculpa para compartilhar bons momentos juntos. Como outros fazem com uma partida de futebol ou uma pescaria. Nesses momentos, passo mais tempo a conversar, a beber cerveja e a divertir-me com os outros writers do que a pintar.
Ainda não tenho planos para organizar uma aqui, embora tenha visto alguns bons muros. Aproveito a visibilidade desta entrevista para deixar um recado: se quiseres organizar uma jam comigo, não hesites em contactar-me.
Qual foi o lugar mais inusitado em que já deixaste uma das tuas peças?
Não tenho certeza de quão incomum é, mas larguei alguns tags nas carrinhas de empresas de remoção de graffiti. Foi muito engraçado.
Tens alguma história que queiras partilhar?
É a história de uma sociedade que cai e que, ao cair, vai repetindo para si mesma para se tranquilizar: até agora tudo bem, até agora tudo bem, até agora tudo bem... O importante não é a queda, é a aterragem.
"La Haine"
Quais são os teus planos / projetos futuros?
Não tenho planos para o futuro. Apenas continuar a pintar enquanto me der prazer. De resto, devemos deixar-nos levar pelas oportunidades e pelo destino.
Cumprimentos / agradecimentos?
Um grande obrigado a ti por me dares a oportunidade de me expressar e, através das tuas perguntas, refletir sobre a minha prática de graffiti (é sempre uma boa coisa para fazer). Um grande obrigado a todos os amigos ALN / TLS / GBR / A2M / WTC. Vocês são ótimas pessoas e eu aprecio cada momento convosco, mesmo que sejam cada vez mais raros. Um grande obrigado também a todas as pessoas que me trouxeram felicidade, estarei lá para vocês. E, por fim, um muito obrigado antecipadamente aos próximos encontros que farei e que tenho a certeza que me trarão muito.
Fotografias / Photos: OPAF & Da Chic Thief
ENG
The graff also has these scenes... I was taking pictures in Ginjal when I came across the French artist OPAF who was getting ready to paint a new piece. After the presentations, we agreed to exchange impressions on Instagram. The next day, when I went there to photograph the completed work, I ran into the author again, who was running to see the final of the Football World Cup. The blues didn't win, but not everything was lost. I got a new interviewee and OPAF had the opportunity to paint in the last Magus jam. Enjoy the interview with this fan of science fiction and animation series. And here's to more meetings like this!
What is the meaning of your tag?
When I started graffiti I wasn't comfortable with letters (I know that's the last straw). So every time I started a new piece I changed my name because the previous letters didn't suit me. Until one day I met a German nomad artist who lived in the abandoned factory where I started. He advised me to choose my initials and to continue with those letters. As I didn't like the letters of my initials, I chose my father's initials, which are more graphic for me. Here is the meaning of my blase. Since then I've been using the Futurama alien alphabet to write my blase. This allows me to differentiate myself and also makes it harder for the police to do their job.
Do you have an art background?
I don't have an artistic background as such. When I was a kid I used to draw a lot of little comics with my friend Théo Schulthess (who has become a professional illustrator) and we used to distribute them in the playground. Apart from that, I studied graphic design during my studies in communication. I use it to build my posters but that's all.
When did your interest in graffiti start and what were your influences at the time?
I started graffiti when I was 15 (I'm 31 now). At that time I was influenced by comics and punk culture. I looked at the graffiti I saw on my various trips and the anti-system messages tagged with great attention.
One day a friend of mine came back from his weekend with spray paint cans and proposed me to go painting together. We went to paint the public toilets of my childhood village. After 20 minutes locked in a toilet to paint all the bullshit we could think of, we came out completely stoned (aerosol is not a good thing for the brain). So I came out of the toilet high and with a new addiction: graffiti.
What was the graffiti scene like when you started?
When I started graffiti around 2006, the world (not just graffiti) was in the social networking revolution. Where before, to see graffiti, you had to travel or read specialized magazines, the creation of Facebook (2004) allowed all writers to share their art. So it became easier to see graffiti and share it. At that time it was still about the work in the street and the cleanliness of it. I started out with a lot of comments about the cleanliness of my lines and that's what I try to continue.
In how many countries have you painted?
According to the UN there are 193 countries in the world. Until I have painted them all, for me there will never be enough.
In this journey through our country, how would you describe the current panorama of graffiti and street art in Portugal? What differences do you find compared to France?
I have not lived in Portugal long enough to answer this question properly. However, as a Franco-Portuguese I have seen that in Portugal many industries (but also buildings) have unfortunately closed their doors. This leaves a lot of creative spaces free for graffiti artists. For me this is one of the reasons why graffiti in Portugal is so alive. Graffiti is a popular art and having this kind of space is more than necessary to express all the emotions.
In France we have a little less free space because we have fewer closed industries (although this is changing). Apart from that, there is very little difference between the French and the Portuguese graffiti scene. The Graffiti movement is a worldwide expression movement. And the rules are the same everywhere. The Portuguese scene is probably distinguished by the Saudade.
What are your favorite spots / cities to paint?
I really like abandoned places to paint. For several reasons: firstly the cops rarely come and bother you when you paint in these places and secondly because I can take the time to paint. It's important for me to take my time to paint. The world we live in goes very fast and painting is for me a moment where time stops and I can find myself. For a moment, it's just me and the wall. Everything else is irrelevant.
How is your creative process and where do you get inspiration for your pieces?
I draw my inspiration from everything around me. But more particularly from science fiction, which is another of my great passions. I like to start from works of science fiction more or less known to the general public, to reduce them to their essence and to use them to highlight facts of society that touch me. I hope, in a modest way, to contribute to social debates with my work.
Do you sketch or freestyle?
A mix of both. When I have the idea I make a lot of little sketches with very little work to place the main elements and structures. Apart from that all the details are worked directly on the wall.
Graffiti, stencil, paste up…what is your favorite style?
All of them! I use all these techniques. I started my practice with graffiti and tagging. Since 4 or 5 years I use more and more collage. This allows me to invade a city in a short time and for very little money. As for stencils, I mainly use them for the works I exhibit.
Do you also paint on canvas? How many exhibitions have you done?
Yes, I also paint on canvas. Or rather on frames made from pieces of pallets that I find in the street. I prefer this medium when I paint works for my exhibitions. It allows me to bring a piece of the street into a more conventional place. At the moment I have one solo show and several group shows.
What plays on your playlist when you produce your art?
It depends a lot on my mood and the people I paint with. It can be anything from T'Choupi (Big up to TLS / GBR / WTC) to classical music. More generally what I listen to is rap music. I really like the High Focus collective in London and the L'animalerie collective in Lyon. They probably make up 80% of what I listen to when I paint.
What is your top 3 Portuguese writers / artists?
I appreciate the work of Bordalo II, Odeith, Pampa, Mais Menos, Pantonio e Vhils to name but a few. I would not be able to make a top 3.
What about foreign writers / artists?
I follow many artists from different countries. But to be honest, the graffiti artists I like the most are my friends.
Which writer / artist would you like to do a joint piece with?
I don't particularly have a name in mind. I go mostly by feel.
You already organized some jams in France. Do you have plans to organize one here?
Yes, I have organised several large and small jams in France. I like these atmospheres where we meet to share our passion and paint. What I like the most is what I call the "BBQ graffiti". That is to say that painting a wall is just an excuse to share a good time all together. Like others might do for a football match or a fishing trip. In these moments I spend more time chatting, drinking beers and having fun with the other graffiti artists than actually painting.
I don't have any plans to organise one here yet, although I have spotted some good walls. I'm taking advantage of the visibility of this interview to pass on a message: if you want to organise a jam with me, don't hesitate to contact me.
What was the most unusual place you left one of your pieces?
I'm not sure how unusual it is, but I've dropped a few tags on the vans of graffiti removal companies. It was very funny.
Do you have a story you want to share?
It's the story of a society that falls and that, as it falls, keeps repeating to itself to reassure itself: so far so good, so far so good, so far so good...
The important thing is not the fall, it's the landing.
"La Haine"
What are your future plans / projects?
I have no plans for the future. Only to continue to paint as long as it gives me pleasure. For the rest we'll just let ourselves be carried along by opportunities and destiny.
Greetings / thanks?
A big thank you to you for giving me the opportunity to express myself and through your questions to reflect on my graffiti practice (it's always a good thing to do). A big thank you to all the ALN / TLS / GBR / A2M / WTC buddies. You are great people and I appreciate every moment with you, even if they are becoming more and more rare. A big thank you also to all the people who brought me happiness, I will be there for you. And finally a big thank you in advance to the next meetings that I will make and that I am sure will bring me a lot.
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